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Esperança: teu nome é Sofia
Termina enfim o numeroso dia, travessia exausta de cuidados e preocupações. No acanhado quarto do hospital, cai silencioso o manto da noite. Agora, distantes e abafados, só o que há são breves rumores: passos lentos pelos corredores, farfalhar de lençóis, bips intermitentes de aparelhos de controle... A claridade é amena, mas uma réstia de luz, vinda da luminária lateral, alcança o rostinho de Sofia. Debruçada sobre o berço, a extenuada mãe observa cada detalhe da filha... Por um instante, tento imaginar o que se passa pela mente da zelosa mãe:
Feito um barco à deriva, sinto-me vagando entre dois tempos. De um lado, os ligeiros ponteiros da biologia me dizem que o difícil adeus se aproxima. Do outro, os emperrados ponteiros da justiça dilatam e intensificam minha angustia... Mas ainda me resta uma esperança: os velozes ponteiros das redes sociais. É sempre assim: nos momentos mais críticos, é o povo que acode o próprio povo – eterna reciprocidade dos iguais.
Um breve respirar e meus olhos se voltam para o berço. Reparo no delicado punho voltado para cima. Suave, entrelaço minha mão em tua delicada mãozinha. Em perfeita sintonia com as mãos, nossas almas também se entrelaçam. Noto que a angelical face não denuncia o menor sofrimento, fato que me deixa confortada. Durma em paz, amor meu. Só não esqueças de acordar, minha vida, meu destino. Saiba que a luz da tua face é o alimento que me fortalece... De um instante, sem que eu perceba, começam a girar sobre mim as invisíveis rodas do sublime. Com elas, um pouco modificado pela força do meu querer, vem-me um trecho de um salmo:
“...Os meus olhos estão continuamente no Senhor, pois ele tirará os meus pés da rede.
Olha para mim, e tem piedade de mim, porque estou solitária e aflita.
As ânsias do meu coração se têm multiplicado; tira-me dos meus apertos.
“Olha para a minha dor, e perdoa todos os meus pecados...”
Mais uma vez meus olhos se voltam para a inocente face. Sinto que meus sonhos já abraçaram teus sonhos; e que a tua paz, infinita, já dorme tranquila em meu coração... Já és minha, amor meu. Haja o que houver, jamais me esquecerei das tuas mãozinhas erguidas no ar, da tua ávida boquinha voando em direção ao meu seio. Haja o que houver, comigo viverás para sempre: minha amada, minha vida...
Não. Como autor, é impossível continuar imaginando. Jamais conseguirei imaginar a dimensão de tal sofrimento. Algo me diz que só mesmo uma mãe é capaz de distinguir as cores e as sombras de tão complexo sentimento.



2 comentários:

  1. Silvio, tomamos a liberdade de traduzir para o inglês e publicar, com crédito, na página https://www.facebook.com/savesofia. Agradeço em nome das milhares de pessoas que apoiam a causa da Sofia.

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  2. Eu é que agradeço, querida! Parabéns pela iniciativa. Forte abraço...

    Silvio.

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